O trabalho é o local onde as pessoas passam grande parte do seu dia e, a depender das condições laborais, pode se tornar um dos grandes vilões da saúde dos colaboradores. Cada vez mais frequentes, os tipos de doenças ocupacionais podem ser múltiplos, estando entre os mais presentes os distúrbios osteomusculares, as lesões por esforços repetitivos e os transtornos mentais e comportamentais.
Quando o problema é psicológico, o que fazer?
As principais doenças ocupacionais do Brasil estão ligadas às mais variadas profissões e podem acontecer dentro de qualquer organização, desde um pequeno setor de produção na zona rural até as grandes empresas e escritórios na zona urbana. Nos últimos anos, o que até então era voltado para problemas físicos, passou a ter também uma análise focada em questões psicológicas, já que em muitas situações o funcionário pode adquirir transtornos ocasionados pelo ambiente de trabalho.
Nesse contexto encontra-se o webdesigner Márcio Serafim, que atuava no setor de comunicação de uma instituição particular de ensino, localizada no bairro de Ondina. Márcio, que realizava suas demandas no interior do colégio, faculdade e teatro, ambos pertencentes ao mesmo grupo, afirma que adquiriu problemas psicológicos mediante ao tratamento recebido por sua superior.
"Quando mudaram a gestão eu e meus colegas passamos a conviver com uma série de críticas diariamente, fui insultado diversas vezes, chamado de incompetente, de "piada", dentre outras agressões verbais. Em um dos momentos cheguei a chorar dentro setor por conta do tratamento humilhante que recebia. A gestora fazia questão de se distanciar de nós e proferir ofensas a todos os membros da equipe.
Permanecer no ambiente de trabalho se tornou cada vez mais difícil para o profissional, que decidiu tomar uma atitude para tentar reverter a situação: “Procurei o setor de recursos humanos para relatar os fatos e reclamar sobre a postura da pessoa responsável pela gestão. Perdi as contas de quantas vezes estive no RH, inclusive acompanhado da equipe. Os próprios funcionários informaram que já possuiam outras reclamações semelhantes, mas, nada foi feito”, ressalta.
Sem nenhum tipo de solução para sua ocorrência, Márcio optou por procurar ajuda profissional "Fui diagnosticado com fortes abalos emocionais e iniciei um tratamento psiquiátrico com antidepressivos. Reportei a empresa, e tenho documento que comprova isso, mas em nenhum momento recebi o suporte devido", comenta.
O webdesigner hoje, se vê em um momento delicado da sua vida profissional: "Sofri retaliações e tempos depois acabei sendo demitido, assim como a maioria dos que prestaram queixas, por conta disso, fiquei com trauma de retornar ao mercado de trabalho e acabar me deparando com outro gestor assim. Hoje não tenho como manter as consultas com o psiquiatra e nem o uso do medicamento, pois estou desempregado".
Com base no relato do profissional, a equipe do Portal A TARDE entrou em contato com a assessoria do Grupo Educacional, que emitiu uma nota: "Informamos que as nossas instituições seguem as normatizações da segurança e medicina do trabalho. É com espanto que recebemos uma denúncia dessa monta feita por um ex-colaborador. Buscamos e não encontramos registros de ocorrência semelhante".
O médico do trabalho, pós-graduado em psiquiatria, doutor Carlos Eduardo Reis de Souza, aponta que em casos de doenças ocupacionais, o suporte é essencial: "A empresa deve dar todo suporte e esclarecer o que ocorreu, avaliar o ambiente de trabalho, e o que for constatado deve ser avaliado para prevenir novas causas".
Mestre em saúde coletiva, o doutor ressalta que tal apoio deve ser dado desde a apresentação de um atestado médico até o afastamento. "A lei fala que os trabalhadores têm direito a remuneração em relação aos dias de ausência e as empresas que possuem um médico do trabalho no quadro de funcionários também podem solicitar que o mesmo avalie a necessidade do afastamento", explica.
A lei citada pelo médico é a 605/49, no artigo 12, §1º e 2º, que menciona a avaliação de veracidade de um atestado médico para que o abono seja concedido: "A súmula TST indica que cabe ao médico do trabalho avaliar se aceita ou não o atestado médico. Mas, são raros os casos em que o atestado não é validado", conta o doutor Carlos Eduardo.
Pressão no trabalho e doenças físicas
O técnico em manutenção em equipamentos, Darlan Costa, também diz ter sido vítima de doença ocupacional e ao contrário do que é direito por lei, o mesmo também não recebeu suporte da empresa.
Darlan trabalha com manutenção de equipamentos voltados para área de sondas de perfuração de petróleo em uma empresa localizada no município de São Sebastião do Passé. O caso segue em processo na justiça do trabalho e por esse motivo, o nome do empreendimento não será divulgado.
"Pelo esforço repetitivo de carregar peso acima do permitido, fui diagnosticado com hérnias de disco na coluna lombar", explica o técnico em manutenção, que acrescenta: "Na teoria não era pra acontecer isso, pois há suportes pra movimentar tais peças como empilhadeiras, carros de carregamento, mas na prática o que voga é a aceleração do serviço, mediante a pressão dos supervisores".
Após o diagnóstico, a empresa encaminhou o técnico para o médico do trabalho responsável e em seguida ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), para recolher o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
Nesse contexto, doutor Carlos Eduardo sinaliza qual o perfil de doença pode permitir este tipo de benefício: "Existem dois tipos de auxílio, para doença comum e para doença acidentária. O primeiro não recolhe o FGTS e o segundo sim, permitindo a estabilidade financeira temporária por 12 meses".
Darlan garante que mesmo após seu diagnóstico, a abordagem na empresa permanece a mesma e que na mesma situação encontram-se outros 9 colegas do mesmo setor.
Segundo informações do doutor Carlos Eduardo, é de suma importância que ao confirmar uma doença ocupacional, a empresa comunique os funcionários sobre o caso e adapte as estratégias de trabalho para que o perigo seja evitado.